Nascida em 1828 no seio da alta sociedade francesa, Marie-Félicie-Clémence de Reiset teve acesso a uma educação musical esmerada. Formou-se como cantora com Laure Cynthie Damoreau, estudando também composição com Saint-Saëns e piano, com Chopin. Apesar do seu casamento em 1851 com o visconde de Grandval, e contrariando as tendências sociais da época, prosseguiu os seus estudos musicais e iniciou uma carreira como compositora, que lhe viria a granjear o Prémio Rossini em 1880 e o Prémio Chartier em 1890. Desempenhando um papel importante na Société Nationale de Musique, tornou-se num dos autores mais tocados em França. Essa carreira não se fez sem dificuldades. Tendo publicado a primeira obra, Sou de Lise, em 1859, sob o pseudónimo de Caroline Blangy, a sua posição social levou-a a recorrer várias vezes a esse subterfúgio para ocultar a sua verdadeira identidade. Ao longo das décadas seguintes, produziu uma obra vasta no domínio da música sacra, música orquestral e música de câmara, para além de seis óperas, peças para piano e mais de sessenta canções. A sua actividade foi frequentemente ensombrada pelo preconceito, firmemente enraizado na época, em relação à presença das mulheres no mundo da composição. Na sequência da atribuição do Prémio Rossini em 1880, Camille Saint-Saëns (que dedicou a Clémence de Grandval o seu Oratorio de Noël) escreveria acerca das suas peças: «seriam certamente célebres se o autor não tivesse o defeito, irremediável na opinião de muita gente, de ser mulher». O Stabat Mater, estreado em 1870, veio a ser a obra mais popular de Clémence de Grandval, vindo a integrar o repertório regular de muitas igrejas francesas e de muitas sociedades de concertos. A obra desenvolve-se como uma cantata, com uma introdução instrumental, à qual se sucedem nove números vocais (corresondendo cada um a uma das estrofes do hino medieval) que apresentam diversas combinações das vozes solistas (árias, duetos, trios e quartetos), pontuadas por intervenções do coro. Escrita originalmente para coro, solistas e orquestra, a obra foi publicada em 1872 numa versão (da própria compositora) para coro, solistas, com acompanhamento de piano e órgão (harmónio). Embora esta edição refira a existência de uma versão para grande orquestra e inclusivamente a existência de partes separadas disponíveis (provavelmente para alugar), não chegaram até aos nossos dias nem a partitura nem as partes da versão orquestral, desconhecendo-se mesmo a composição instrumental original. Assim, e apesar de tentativas para a reconstrução da partitura orquestral a partir da redução para piano, a maior parte das execuções modernas do Stabat Mater, tem recorrido à versão com piano e órgão (ou harmónio). Foi esta também a opção tomada para o presente concerto. A recriação da prática musical numa igreja francesa do século XIX, com um pequeno coro de onde emergem as vozes solistas, foi também tida em consideração nesta interpretação do Stabat Mater de Clémence de Grandval, que constitui a primeira audição em Portugal desta obra musical injustamente esquecida.
— Inês Thomas Almeida · João Vaz —
18 outubro October
Sé do Funchal
Sábado, 21H30
Capella de S. Vicente
Sofia David (solista), Margarida Vieira, Mariana Moldão Martins, Rita Carvão, sopranos
Salomé Monteiro (solista), Bianca Varela, Catarina Baptista, Rita Meireles, altos
Dinis Rodrigues (solista), Frederico Projecto, João Coutinho, Miguel Líbano Monteiro, tenores
Manuel Rebelo (solista), Henrique Coelho, Martim Líbano Monteiro, Pedro Casanova, baixos
Anikó Harangi, piano
Laura Mendes, órgão
Pedro Rodrigues, direção
Clémence de Grandval (1828-1907)
¬ Stabat Mater
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