Duas compositoras, duas organistas.
O presente programa destaca a riqueza e diversidade da obra para órgão das compositoras francessa Mel Bonis e Jeanne Demessieux. Aluna de César Franck e Ernest Guiraud no Conservatório de Paris, Bonis deixou um vasto legado que inclui obras para piano solo e a quatro mãos, peças para órgão, música de câmara, canções, música coral, uma missa e composições orquestrais. A Sortie op. 96 abre o programa com uma energia vibrante e radiante, característica das peças destinadas a finalizar celebrações litúrgicas. A Improvisation op. 154 revela um carácter livre e meditativo, evocando uma oração traduzida em música, onde a sensibilidade e a delicadeza se unem. A Élévation em Mi bemol maior op. 151 destaca-se pela sua simplicidade e serenidade, criando um ambiente de recolhimento que convida à meditação interior, adequado ao momento litúrgico em que é executada. No Andante religioso op. 173, Bonis combina uma melodia simples com uma harmonia delicada, criando um momento de profunda tranquilidade interior. O Quasi Andante op. 152 prossegue nesta linha intimista, enquanto o Offertoire (grand choeur) op. 182 retoma uma dimensão solene e majestosa, enriquecida por harmonias refinadas e amplitude sonora, evocando a nobreza da tradição organística francesa. Este percurso sonoro reflete a singularidade de Mel Bonis, compositora prolífica que enfrentou preconceitos de género e nos deixou mais de trezentas obras, entre as quais cerca de trinta peças para órgão. A sua música traz uma voz pessoal inspirada na religiosidade e no lirismo, tornando-se um testemunho precioso no repertório contemporâneo para este instrumento.
Jeanne Demessieux foi a primeira organista, mulher, reconhecida internacionalmente. Com uma carreira performativa intensa, realizou tournées pela Europa e América do Norte tendo sido a primeira mulher a apresentar-se como organista solista em salas de concertos. As suas capacidades técnicas eram muito elogiadas na época, sendo considerada por Marcel Dupré «la plus grande de toutes les organistes». Ganhou prémios em várias competições, nomeadamente de piano, órgão e improvisação. Para além do seu percurso singular como organista, Demessieux é também reconhecida pelas suas composições para órgão. A escolha das obras a apresentar neste concerto, teve como objetivo trazer ao público linguagens contrastantes. Lumière faz parte do conjunto Sept méditations sur le Saint-Esprit, sendo a registação o elemento que realça o seu carácter etéreo. O uso de misturas, em ambas as mãos, a par das figuras rápidas e de um registo de 4 pés no pedal, transmitem a ideia de luzes que se movem pelo espaço. Rorate caeli, prelúdio de coral sobre um tema gregoriano, impressiona através das harmonias que acompanham a melodia delicada. Por fim, e em contraste com as duas obras anteriores, poder-se-á ouvir a imponência do Te Deum. Inicia-se com a apresentação do tema, de forma grandiosa, que se vai desenvolvendo através da combinação de efeitos rítmicos e da complexidade harmónica, afastando-se gradualmente do carácter inicial. A secção intermédia possui um ambiente mais contemplativo, com uma registação especial. Após este breve momento, existe um regresso à agitação rítmica que culmina no tema da obra, adornado harmonicamente de forma extraordinária.
— Beatriz Resendes · Laura Mendes —
17 outubro
Igreja de São João Evangelista, Funchal
Sexta-feira, 21H30
Laura Mendes*, órgão
Beatriz Resendes**, órgão
Mel Bonis (1858-1937)
¬ Sortie Op. 96*
¬ Improvisation Op.159*
¬ Élévation em Mi bemol maior Op.160*
¬ Andante religioso Op.173*
¬ Quasi andante Op.152*
¬ Offertoire (grand choeur) Op.182*
Jeanne Demessieux (1921-1968)
¬ Lumière**
(7 Méditations sur le Saint-Esprit, Op. 6, n.º 7)
¬ Rorate Caeli**
(12 Choral Preludes on Gregorian Chant Themes for Organ, 1950)
¬ Te Deum, Op.11**
Mel Bonis
¬ Suite en forme de valses* **
› Ballabile
› Valse lente
› Danse sacrée
› Scherzo-valse
› Interlude et bacchanale