Sábado, 18 de Outubro, 21h30
Sé Catedral
Rui Paiva: órgão
Ensemble Vocal da Academia de Música de Santa Cecília
António Gonçalves: direção
O Órgão desde muito cedo assumiu várias morfologias. Partindo do pequeno Portativo, que podia ser levado à mão em procissões e cortejos especialmente no decorrer do séc. XIV, passando pelo Positivo já de razoável dimensão sonora, este instrumento foi assumindo um complexo percurso organológico. A par dessa evolução, também as suas funções culturais e sociais se adaptaram às necessidades de cada tempo e geografia. A associação do Órgão à liturgia e ao espaço religioso católico é indubitável, desde o séc. XIII, passando de exceção a uma presença exclusiva. Acompanhando as reformas religiosas dos séculos vindouros, com consequências práticas na liturgia, o instrumento foi-se demarcando consoante a sua origem geográfica. No continente europeu identificam-se algumas famílias de Órgãos, distintas nas suas características organológicas, com exemplares de construção ibérica, alemã, italiana, francesa e inglesa como é o caso do instrumento deste concerto.
A primeira parte do programa é dedicada à estética barroca. Partindo da dança francesa de métrica quadrada, ouviremos a primeira das sete cantatas da Oratória Membra Jesu nostri patientis sanctissima, composta em 1680 por Buxtehude para coro a 5 vozes. Considerada a primeira oratória Luterana, tem os seus textos retirados do Antigo Testamento e alusivos a sete partes diferentes do corpo crucificado de Cristo. Deste volume de cantatas ouviremos a referente aos pés (Ad pedes), numa redução para teclado baseada na versão para orquestra de câmara.
O repertório barroco para tecla, com exceção às obras que incluam pedaleira, não é indicado exclusivamente para cravo ou órgão. Quer como instrumento solista ou como baixo contínuo em contexto de música de câmara, há uma liberdade interpretativa na escolha do instrumento harmónico. Apela-se naturalmente a uma sensibilidade distinta na arte de os tanger, dadas as diferenças organológicas entre o cordofone plectrado (o Cravo) e o aerofone de tecla (o Órgão) e pelas consequências que daí advêm já que, no segundo, o organista faz prolongar o som pelo tempo que desejar.
A Sonata para tecla em Dó menor de Seixas, publicada em 1980 por Santiago Kastner na série Portugaliae Musica da Fundação Calouste Gulbenkian, inicia-se com um fugato a duas vozes por um motivo de quatro notas repetido incessantemente ao longo dos seus 45 compassos mas que rapidamente dá lugar a outros desenvolvimentos melódicos e a uma estruturação harmónica simples alternante entre a tónica e a dominante, com breves momentos de sequências harmónicas.
Passando à segunda parte do programa, e dada a ponte feita pelo hino mariano composto pelo organista João Vaz, chegamos ao repertório inteiramente inglês. De Elgar, compositor do Romantismo, ouviremos duas pequenas peças para Órgão, de caráter contrastante, integrantes das Vesper Voluntaries. Dando lugar a sonoridades mais contemporâneas ouviremos Toccata in Seven, composta porJohn Rutter em 1974. Apesar de recuperar uma designação musical com cerca de cinco século de história, associada não raras vezes a expressões mais virtuosísticas para tecla, o compositor inglês aplica uma métrica irregular de sete tempos por compasso, fazendo variar a distribuição pelas possibilidades de agrupamento unitário (3-2-2 e 2-2-3) e assim alternar a acentuação no decorrer de três pequenos momentos de caráter distinto. John Rutter é igualmente reconhecido pelas inúmeras obras sacras para Coro e Órgão, bem tradicionais da escrita musical inglesa, das quais ouviremos duas das mais interpretadas. Por fim, e num tom declaradamente festivo, ouviremos duas obras de Malcolm Archer, organista, maestro e professor em Winchester (no centro de Inglaterra).
João Pedro Afonso
Jean-Philippe Rameau (1682-1764) / arr. Yves Rechsteiner (1969)
Rigaudon
Dieterich Buxtehude (ca.1637-1707)
Cantata "Ad pedes", da oratória Membra Jesu Nostri, BuxWV 75
Prelúdio, fuga e chacona em dó maior, BuxWV 137
Giovanni Pierluigi da Palestrina (1525 - 1594)
Surge, illuminare
Carlos Seixas (1704-1742)
Sonata em dó menor
João Rodrigues Esteves (ca. 1690/1700-ca. 1755)
Regina Coeli
João Vaz (1963)
Ave Maria
Edward Elgar (1857-1934)
Vesper Voluntaries, Op.14
III - Andantino
VII - Allegretto pensoso
Ave verum, Op. 2, No.1
John Rutter (1945)
Toccata in Seven
A Gaelic Blessing
The Lord bless you and keep you
Malcolm Archer (1952)
Festival Finale
Rejoice, the Lord is King
Participantes
Rui Paiva Concluiu o curso de Órgão do Conservatório Nacional de Lisboa, na classe de Joaquim Simões da Hora. Como bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian, prosseguiu os estudos daquele instrumento com Montserrat Torrent, no Conservatório Superior de Barcelona, e, sob a orientação de José Luis González Uriol, diplomou-se em Cravo e Órgão no Conservatório Superior de Saragoça. Tem colaborado como organista e cravista em diversos conjuntos instrumentais e vocais. Como solista ou em grupo, tem-se apresentado em diversos concertos no País, bem como no estrangeiro. Realizou várias gravações discográficas, com destaque para a música portuguesa dos séculos XVI, XVII e XVIII. Rui Paiva foi professor de Órgão no Conservatório Nacional de Lisboa e é atualmente diretor da Academia de Música de Santa Cecília de Lisboa. |
Ensemble Vocal da Academia de Música de Santa Cecília Formado por cerca de 20 alunos e ex-alunos da Academia de Música de Santa Cecília, este agrupamento existe desde 2002 e surgiu da necessidade de criar um grupo vocal misto que desse continuidade ao trabalho realizado na disciplina de Coro daquela escola de ensino integrado da música. Tem realizado diversos concertos dos quais se destacam as apresentações no Mosteiro dos Jerónimos, na Culturgest, no Grande Auditório do CCB, no Festival Música em S. Roque, e a recente apresentação da ópera “Dido e Eneas”, de Purcell, no Palácio Foz em Lisboa. |
António Gonçalves
António Gonçalves iniciou os seus estudos musicais no Instituto Gregoriano de Lisboa e posteriormente ingressou na Escola Superior de Música de Lisboa onde se licenciou em Direção Coral, sob a orientação de Roberto Pérez e Vasco Pearce de Azevedo, e em Canto Gregoriano, sob a orientação de Maria Helena Pires de Matos. Atualmente dirige a Camerata Vocal de Torres Vedras, é membro do Coro Gregoriano de Lisboa e do Coro da Fundação Calouste Gulbenkian. Lecciona a disciplina de Coro na Academia de Música de Santa Cecília. Com estes agrupamentos apresentou-se em concerto em Portugal bem como Espanha, França, Holanda, Luxemburgo, Suíça, Itália e Áustria.
Notas ao Órgão
Sé Catedral
Na Sé do Funchal, a presença de um órgão surge documentada pela primeira vez no alvorecer do século XVI. Em 1739, D. João V ofereceu à Sé um novo órgão, construído em Lisboa pelo organeiro Francisco do Rego Matos. Em 1740, o Cabido mandou colocar este instrumento na primitiva tribuna, situada à esquerda da capela-mor. Encontrando-se num estado não funcional, em 1925 o órgão foi desarmado e, onze anos depois, oferecido à Igreja do Colégio. Em sua substituição, o Cabido da Sé optou por comprar o órgão então pertencente à Igreja Anglicana. A acta da sessão do Cabido da Sé, lavrada a 5 de Janeiro de 1937, refere “que por ordem de Sua Ex.ma Reverendíssima, o Senhor Bispo havia comprado o actual órgão que pertencia à Igreja Anglicana, cujo custo foi de trinta e quatro contos e quinhentos escudos, acrescidos das despesas de transporte, montagem, etc”, sendo colocado no coro alto à entrada da porta principal da Sé. Este instrumento, desde então várias vezes intervencionado, foi construído em Inglaterra no ano de 1884, por encomenda de um médico inglês que residia na Madeira e que também se dedicava à arte organística. A dada altura, este médico decidiu oferecê-lo à Igreja Anglicana.
O órgão resultara da colaboração de vários organeiros, tendo sido o responsável pela montagem T. A Samuel no ano de 1884 (Organ Builder, Montague Road, Dalston-London). Os tubos – ou uma parte dos tubos – foram construídos pela firma Charles S. Robson (1861), os someiros pela firma Wilson Gnnerson, os teclados pela firma S. W. Browne e uma parte dos tubos metálicos pela empresa A. Speneir (1884).
Originalmente munido de uma tracção mecânica, há três décadas o instrumento sofreu consideráveis modificações, tendo-se alterado partes do mecanismo e acrescido alguns registos palhetados “em chamada”. Estas intervenções acabaram por descaracterizar completamente o órgão, sem lhe conferir maior qualidade musical. Em consequência disto e com a intenção de proporcionar à Sé Catedral um instrumento adequado para fins litúrgicos e concertísticos, realizaram-se nos anos de 1995/96 importantes obras de restauro que foram levadas a bom termo por Dinarte Machado.
I Manual (C-g’’’)
Open Diapason 8’
Flöte 8’
Holz Bourdon 8’
Principal 4’
Waldflöte 4’
Nazard 2 2/3’
Super Octave 2’
Mixture 1 1/3’ de 4 filas
Dulçaína
Trompette 8’
II Manual (C-g’’’)
Voix Celeste 8’
Gamba 8’
Gedeckt 8’
Principal 4’
Spitzflöte 4’
Octave 2’
Simbala 1’ de 4 filas
Krummhorn 8’
Tremblant
Pedal (C-g’’’)
Subbass 16’
Open Diapason 16’
Octave 8’
Bombarde 16’
Trompette 8’
Acoplamentos
I/II
I/Pedal
II/Pedal