Terça-feira, 13 de outubro, 11h00 João Vaz, Dinarte Machado A presença inglesa A presença inglesa na Madeira, sentida sobretudo ao longo do século XIX, teve diversas repercussões na vida cultural. Um dos sinais dessa influência foi a importação de um número significativo de órgãos produzidos em Inglaterra, os quais vieram a equipar várias igrejas da Ilha. Esta visita pretende dar a conhecer dois dos instrumentos ingleses que hoje subsistem no Funchal: o órgão da Igreja de São Pedro, um pequeno instrumento construído pela firma Flight & Robson e que subsiste num estado próximo do original, e o órgão da Sé do Funchal, um instrumento de maiores dimensões, originalmente montado por T. A Samuel e que sofreu muitas transformações até aos nossos dias. A visita permitirá desvendar algumas das caraterísticas do funcionamento destes dois instrumentos, assim como a audição de obras a eles especialmente adaptadas. |
Participantes
João Vaz Natural de Lisboa, João Vaz é doutorado em Música e Musicologia pela Universidade de Évora, tendo defendido a tese A obra para órgão de Fr. José Marques e Silva (1782-1837) e o fim da tradição organística em Portugal no Antigo Regime, sob a orientação de Rui Vieira Nery. É diplomado em Órgão pela Escola Superior de Música de Lisboa, onde estudou sob a orientação de Antoine Sibertin-Blanc, e pelo Conservatório Superior de Música de Aragão em Saragoça, tendo trabalhado com José Luis González Uriol, como bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian, sendo também licenciado em Arquitetura pela Universidade Técnica de Lisboa. Tem mantido uma intensa atividade a nível internacional, quer como concertista, quer como docente, em cursos de aperfeiçoamento organístico. Efetuou mais de uma dezena de gravações discográficas a solo, salientando-se as efectuadas em órgãos históricos portugueses. Como executante e musicólogo tem dado especial atenção à música sacra portuguesa, fundando em 2006 o grupo Capella Patriarchal, que dirige. As suas publicações incluem artigos que incidem sobretudo na música de tecla portuguesa. Lecciona atualmente Órgão na Escola Superior de Música de Lisboa, tendo também exercido funções docentes no Instituto Gregoriano de Lisboa, Universidade de Évora e Universidade Católica Portuguesa (Escola das Artes). Fundador do Festival Internacional de Órgão de Lisboa em 1998, é atualmente diretor artístico das séries de concertos que se realizam nos seis órgãos da Basílica do Palácio Nacional de Mafra (de cujo restauro foi consultor permanente) e no órgão histórico da Igreja de São Vicente de Fora, em Lisboa (instrumento cuja titularidade assumiu em 1997). |
Dinarte Machado Desde muito jovem, esteve ligado á música, surgindo o primeiro contacto com os órgãos de tubos ainda com vinte anos de idade, por necessidade imperiosa de restauro no órgão da Igreja Matriz de S. Jorge, no Nordeste, ilha de S. Miguel, lugar que o vira crescer. Em 1987 monta atelier em Ponta Delgada, dedicando-se exclusivamente ao trabalho de organaria, efetuando o seu primeiro restauro: órgão da Igreja Matriz da Ribeira Grande, em S. Miguel. Depois vão-se sucedendo outros restauros em órgãos dos Açores, Madeira, Continente e Espanha e até à data realizou setenta e sete restauros em órgãos históricos, na sua maioria da escola de organaria portuguesa, da segunda metade do século XVIII, em cuja área é especialista. No campo da construção tem feito alguns órgãos de pequena dimensão para estudo e construiu nove instrumentos de maior envergadura, como o que se destinou à Igreja do Colégio do Funchal. Realizou os inventários dos órgãos dos Açores e da Madeira, cujos trabalhos já se encontram publicados. Em 1993, trabalhou em Espanha, com o Mestre Organeiro, Gerhard Grenzing, no restauro do órgão histórico do Palácio Real de Madrid. No Congresso Internacional realizado em Mafra, no ano de 1994, demonstra a existência de diferenças entre os órgãos espanhóis e portugueses a partir da segunda metade do século XVIII. Foi responsável pelo restauro dos seis órgãos da Basílica de Mafra, construídos no reinado de D. João VI, conjunto único no mundo e que representa o expoente da escola de organaria portuguesa, cujo trabalho foi inaugurado em 15 de Maio de 2010. Foi este trabalho reconhecido com o Prémio Europa Nostra em 1 de Junho de 2012. Em Julho de 2010 foi condecorado com a comenda da Ordem de Mérito, por Sua Exa. Senhor Presidente da República. Terminou em 2014 o restauro do maior órgão construído em Portugal, o Órgão Histórico do Mosteiro de Lorvão. |
Notas ao Órgão
Igreja de São Pedro, Funchal O órgão da Igreja de São Pedro foi adquirido em Inglaterra à firma Flight & Robson, no século XIX. Não possuímos documentação relativa ao ano da sua construção mas podemos situá-la antes de 1878, altura em que a mencionada firma foi comprada por Gray & Davison. Tão-pouco sabemos a data exacta da instalação do instrumento na Igreja de São Pedro, mas em dois inventários (1838 e 1841) menciona-se um órgão “em muito bom uso” colocado no coro, facto que permite apontar para o actual instrumento (AHDF Inventário: 3). No decorrer do século XX, o órgão sofreu várias intervenções das quais resultaram, entre outros, a modificação do diapasão e da afinação, sem que tivessem acarretado, no entanto, danos significativos na originalidade do instrumento. Em Agosto de 1904, no decurso de uma campanha de beneficiação do coro alto da igreja, a Fábrica aproveitou também a ocasião para mandar reparar o órgão, tendo sido responsável pelo restauro Alfredo Saturnino Lino. Sabe-se que o conserto do órgão, como do restante conjunto, foi breve, pois em ofício assinado a 6 de Agosto de 1904, o mestre declara que os trabalhos “deveriam ficar promptos até meados do corrente mez”. As obras terminaram de facto a 25 de Agosto; os trabalhos do coro e do órgão custaram 150.000 réis, tendo a Junta Geral do Distrito comparticipado com a importância de 50.000 réis, montante que se destinava exclusivamente ao conserto do órgão. Pelos vistos, esta intervenção deve ter sido pontual, pois passados dois anos, o periódico Heraldo da Madeira noticiava, no dia 15 de Novembro de 1906, que o órgão da Igreja de São Pedro estava a ser sujeito a uma nova reparação. Em 2006, este instrumento foi restaurado por Dinarte Machado. Manual (GG, AA, C, D-f’’’) |
Sé Catedral Na Sé do Funchal, a presença de um órgão surge documentada pela primeira vez no alvorecer do século XVI. Em 1739, D. João V ofereceu à Sé um novo órgão, construído em Lisboa pelo organeiro Francisco do Rego Matos. Em 1740, o Cabido mandou colocar este instrumento na primitiva tribuna, situada à esquerda da capela-mor. Encontrando-se num estado não funcional, em 1925 o órgão foi desarmado e, onze anos depois, oferecido à Igreja do Colégio. Em sua substituição, o Cabido da Sé optou por comprar o órgão então pertencente à Igreja Anglicana. A acta da sessão do Cabido da Sé, lavrada a 5 de Janeiro de 1937, refere “que por ordem de Sua Ex.ma Reverendíssima, o Senhor Bispo havia comprado o actual órgão que pertencia à Igreja Anglicana, cujo custo foi de trinta e quatro contos e quinhentos escudos, acrescidos das despesas de transporte, montagem, etc”, sendo colocado no coro alto à entrada da porta principal da Sé. Este instrumento, desde então várias vezes intervencionado, foi construído em Inglaterra no ano de 1884, por encomenda de um médico inglês que residia na Madeira e que também se dedicava à arte organística. A dada altura, este médico decidiu oferecê-lo à Igreja Anglicana. O órgão resultara da colaboração de vários organeiros, tendo sido o responsável pela montagem T. A Samuel no ano de 1884 (Organ Builder, Montague Road, Dalston-London). Os tubos – ou uma parte dos tubos – foram construídos pela firma Charles S. Robson (1861), os someiros pela firma Wilson Gnnerson, os teclados pela firma S. W. Browne e uma parte dos tubos metálicos pela empresa A. Speneir (1884). Originalmente munido de uma tracção mecânica, há três décadas o instrumento sofreu consideráveis modificações, tendo-se alterado partes do mecanismo e acrescido alguns registos palhetados “em chamada”. Estas intervenções acabaram por descaracterizar completamente o órgão, sem lhe conferir maior qualidade musical. Em consequência disto e com a intenção de proporcionar à Sé Catedral um instrumento adequado para fins litúrgicos e concertísticos, realizaram-se nos anos de 1995/96 importantes obras de restauro que foram levadas a bom termo por Dinarte Machado. I Manual (C-g’’’) II Manual (C-g’’’) Pedal (C-g’’’) Acoplamentos |