October 27 Outubro, Domingo, 18h00
Igreja do Convento de Santa Clara do Funchal
Fernando Miguel Jalôto, Órgão
Ensemble Portingaloise
La Floreta
Catarina Costa e Silva
Diana Campóo
Thiago Vaz
Do Tento à Tentação visita o interessante e variado repertório registado em fontes ibéricas para órgão − Porto, Braga, Coimbra e Madrid − destacando tanto as obras de escrita contrapontística (tento) como as danças peninsulares (pavanas, xácaras, folias ou villanos, entre outras), frequentemente improvisadas, explorando a curiosa confluência dos dois géneros musicais em contextos sacros. Elaborações instrumentais que alternam escrita polifónica e homofónica, os tentos podiam ser usados em diferentes momentos litúrgicos, seguindo os modos eclesiásticos do cantochão.
Por outro lado, as variadas danças que circulavam pela Europa nos séculos XVII e XVIII, eram formas privilegiadas pela composição musical, pela regularidade da sua estrutura e pelas inesgotáveis possibilidades de variação, constituindo ainda um repertório omnipresente na paisagem sonora da época, conhecido por todos, e presente nos salões, nas ruas e nas igrejas. Pela sua riqueza tímbrica e a sua frequente utilização, o órgão era um instrumento igualmente muito familiar, não só no contexto litúrgico ou religioso, mas também em ambientes e funções seculares. Neste concerto dançado desenrola-se uma dramaturgia baseada na interação de quatro personagens: o Mestre de Capela / Organista, o Cantor, e duas Damas. O discurso dramático foi construído a partir de fontes musicais e coreicas em diálogo com testemunhos literários, tanto de origem eclesiástica – como os excertos das Definições e apontamentos do Capitulo geeral que se celebrou em este moesteiro de Sancta Cruz [de Coimbra] em o anno de 1575. manda que guarde en tudos nossos, moesteiros – quanto de natureza secular – como uma notícia na Gazeta de Madrid (1723), ou a descrição de um viajante estrangeiro, recolhida no diário de William Beckford em Portugal e Espanha. Todos evidenciam o caráter ambivalente do repertório para órgão ao longo deste largo período temporal, as tensões associadas à sua transversalidade, e o papel que a dança tinha como prática essencial à sociabilidade, mas também como modelo musical. As diferentes danças, em voga na época em toda a Europa, mas com particular relevo para as de tradição ibérica ou com presença assinalada na Península, constituem o repertório registado nas fontes utilizadas, podendo-se distinguir versões coreográficas originais, bem como ulteriores elaborações instrumentais. O repertório coreográfico original (descrição dos passos, figuras e gestos a serem executados pelos bailarinos), é igualmente retirado de fontes coevas estrangeiras, espanholas e francesas, como o Libro de danzar de don Baltasar de Rojas Pantoja e Aimable Vainqueur, dance nouvelle dancée devant le Roy à Marly de la composition de Monsieur Pecour et mise au jour par Mr. Feuillet (1701), bem como portuguesas, nomeadamente Choregraphie o Arte para saber danzar todas suertes de danzas por choregraphie… (Felix Kinski, 1751).
Esta é uma viagem por um repertório na charneira entre a cultura sacra e a profana, entre o coro alto e o salão, numa permeabilidade e conciliação que caracterizava o complexo perfil cultural ibérico, ainda com reminiscências do Siglo de Oro (século XVII), mas anunciando já a sociedade mais galante e cosmopolita do século XVIII.
— CATARINA COSTA E SILVA —
Programa
Manuel Rodrigues Coelho (ca.1555-1635)
¬ Terceiro Tento do primeiro tom
¬ Versos [do Magnificat] do segundo tom para se cantarem ao órgão
Anónimo (Flores de Música, compilação de Antonio Martín y Coll, 1706)
¬ Pavana & Pavana Sexquialtera
¬ Marizápalos
Anónimo (MM42 – Biblioteca Pública Municipal do Porto)
¬ Espanholetas de primeiro tom
Gaspar Sanz (1640-1710)
¬ Marizápalos
Bartolomeu de Olagué (?-1658)
¬ Xácara de primeiro tom
Carlos Seixas (1704-1742)
¬ Sonatain F major A 6:3
› Moderato
› Giga [Allegro]
› Minueto
Anónimo (Flores de Música, compilação de Antonio Martín y Coll, 1706)
¬ Villano
José Torrelhas (séc. XVII)
¬ Canção do primeiro tom
Bernardo Pasquini (1637-1710)
¬ Partite sopra l’ Aria della Folia da Spagna
André Campra (1669-1764)
¬ L’aimable vainqueur
Anónimo (MS 1394 Biblioteca Pública Municipal do Porto)
¬ Menuet de le mable [de L’Aimable?]
Anónimo (MM42 Biblioteca Pública Municipal do Porto)
¬ Folias de primeiro tom
Arcangelo Corelli (1653-1713)
¬ Allegro e Adagio
(Sonate a Violino e Violone o Cimbalo Op.V, nº 3)
Manuel Rodrigues Coelho
¬ Versos [do Magnificat] do terceiro tom para se cantarem ao órgão